Entrevista com Bianca Lima, bartender de São Paulo e vencedora do World Class 2021

Bianca Lima tem 26 anos e a quatro atende em bares brasileiros. Ela é graduada em design de moda mas acabou migrando sua criatividade para a coquetelaria. Já liderou bares paulistas como Caulí Lounge Bar e Mule Mule Muleria, os dois do grupo DRK, mas também passou pelo restaurante Kouzina e trabalhou com bares de eventos por algum tempo. Recentemente se aventurou para o sul do país, foi gestora e consultora nas duas unidades do Will’s Bar em Porto Alegre, buscando expandir os horizontes da coquetelaria no Brasil.

Conquistou vários títulos em campeonatos de coquetelaria, desde uma competição que ocorreu na sua formatura no Learning For Life; campeã nacional do Behind the Barrel, organizado pela marca Wild Turkey; vencedora do 2º Campeonato de Coquetéis com Bebida Coreana, e agora o título do Diageo World Class Competition Brasil.

Sempre antenada, busca novas tendências, possibilidades e inovações a serem aplicadas à coquetelaria, de forma alegre e irreverente. Desenvolve projetos paralelos para marcas, unindo o mundo dos bares ao design, mídias sociais e qualquer outro seguimento que caiba a beleza da coquetelaria brasileira.

Confira a entrevista

Qual o seu hobby fora do bar?
É bem difícil ter tempo fora do trabalho, tenho dedicado todo meu tempo na área profissional ultimamente. Mas gosto muito de viajar, conhecer lugares novos.

Manter uma conexão com a moda também é algo que gosto de alimentar nas horas vagas, foi minha primeira paixão afinal. Quem olha meu instagram com mais atenção consegue achar ainda alguns vestígios desse meu lado.

Com o que você trabalhava antes do bar?
Trabalhava com moda, estudei Design de Moda por 6 anos. Trabalhei como figurinista numa emissora, como stylist e várias outras coisas que a área nos proporciona. Era uma vida boa.

Sua renda é exclusiva do bar?
Não exatamente. Com a pandemia, vi a necessidade de gerar outras fontes de renda para me manter. Até ali já tinha feito uma consultoria ou outra, mas com os bares fechados acabei desenvolvendo um trabalho de mídias sociais bem interessante e isso começou a me render convites para fazer algumas lives, vídeos para marcas, participação em ações online, etc. Isso se mantém até hoje.

Como foi que você decidiu entrar para a vida de bartender?
Você acredita em amor à primeira vista? Por algum motivo do destino, eu acabei indo trabalhar num restaurante como garçonete e comecei a observar os bartenders dali, eles se moviam de uma forma encantadora, as misturas que eles faziam, a paixão que eles tinham pela profissão, era tudo tão lindo que eu quis experimentar um pouco daquilo. Comecei aprendendo no bar e depois fui fazer um curso, não parei nunca mais.

Há quanto tempo você está na trajetória de bartender?
Antes dessa história linda do restaurante, eu já tinha feito alguns eventos como bartender. Se contarmos esse tempo, 6 anos. Mas com foco maior na coquetelaria, apenas 4. Comecei ontem, como alguns dizem.

O que você mais gosta nessa vida de bartender?
As possibilidades, tudo é possível. Você pode ser o cara da louça para o resto da sua vida, mas você também pode conhecer 52 países e terminar sua vida com um barzinho de praia nas ilhas gregas tranquilamente. Tudo depende do seu esforço e das suas escolhas. A minha vida mudou muito nos últimos anos por conta da minha profissão e espero que continue mudando.

Qual seu drink favorito?
Eu sempre fui apaixonada por Last Word, a combinação de licores mais cara do mercado. Eu diria que esse é um cocktail inconfundível e inesquecível.last word

Quais foram seus mentores de bar?
Essa é fácil, meu primeiro professor no restaurante em que comecei foi o Ricardo Morotti, trabalhou com bar há um tempo atrás mas hoje está um pouco afastado, me ensinou a amar a profissão. Sylas Rocha foi meu mestre por mais tempo, trabalhamos juntos por quase 2 anos e ele sempre me ajudou a desenvolver meus projetos. O nível de exigência dele é altíssimo, sou muito grata em ter me criado com essa lenda.

Qual a situação mais engraçada que aconteceu com você em um bar?
Eu não estava trabalhando, era cliente. Pedi para o bartender me preparar um sour e ele me entregou um cocktail extremamente salgado. Fui tentar falar com ele para entender o “propósito” do meu Whiskey Sour estar salgado e descobrimos que ele tinha feito um “xarope de sal” ao invés de produzir xarope de açúcar para usar nos cocktails. Estava tão gostoso, nunca me esqueço (risos).

Qual a situação mais desastrosa que aconteceu com você em um bar?
Nossa, essa tem várias! Eu sou extremamente desastrada, já quebrei garrafa de Campari em cima da bar station limpinha depois de fechar o bar. Já tomei banho de café porque a coqueteleira abriu no meio do shake. Mas também já tomei banho de bebida intencionalmente para fazer essa foto legal aqui clicada pelo Leo Feltran, fiquei grudando e fui para casa tomar banho. Mas a foto valeu a pena.

Qual drink você não suporta beber?
Não tenho esse ódio de algum cocktail em específico, sou bem versátil na verdade. Sendo um algo bem equilibrado e bem feito, não tenho ressalvas.

Quando e quem famoso você serviu e o que serviu?
Eu sou péssima nisso, não conheço os famosos. Várias vezes deixava passar, atendia as pessoas normalmente e depois descobria que era algum­­ famoso, não dava nem pra tietar. Já passaram alguns como a Maisa, o Jimmy Ogro e vários outros que eu não lembro. Já fiz alguns drinks na TV também, mas não me lembro bem pra quem.

Onde você busca sua inspiração para crias seus drinks?
Na realidade, observando as movimentações sociais, as mudanças de pensamento, as histórias de vida dos meus amigos ou alguma informação interessante. Eu sempre gosto de trazer alguma história junto à bebida. Sobre construção e ingredientes, gosto de acompanhar os bares dos meus amigos e alguns de outros países, não para copiar algum cocktail, mas para imaginar novas possibilidades de sabores.

Para a criação de um coquetel, na sua opinião vale mais inspiração ou conhecimento?
Os dois, você só consegue transformar a sua inspiração em um bom produto se tiver conhecimento. Mas a inspiração também importa pra mim, particularmente ativar essa área da criatividade é o que faz eu me sentir viva.

O que você acha das releituras de drinks clássicos? Qual o seu favorito?
Acho que são o melhor caminho para começar a pensar em cocktails autorais. Entendendo aquele tipo de drink e a função dos seus ingredientes, você pode brincar bastante sem tanta possibilidade de erro. Eu gosto muito do Mark Twain, uma releitura do Fitzgerald feita com Whisky.

Qual o ingrediente “coringa” para você, aquele que fica perfeito em qualquer drink?
Eu gosto de trabalhar com bitters aromáticos, eles são para mim como o tempero para a comida. Você não vai comer alho e cebola puros, mas tente preparar um arroz sem eles para ver se dá certo.

O que para você é inaceitável em um drink?
Falta de coagem em cocktails batidos. Aquela experiência maravilhosa de pedaços de gelo quebrado, muitas vezes pedaços ou resquícios de frutas, isso me incomoda bastante. Não é como se eu estivesse tomando uma caipirinha por exemplo, que é um cocktail montado com pedaços de frutas, a proposta muda.

Na sua opinião, qual o clássico que nunca será ultrapassado?
Nós passamos por muitos clássicos, temos épocas de gostar mais de um ou de outro, mas acredito que se eu pudesse salvar apenas um, ainda seria o Negroni.

No atendimento de bar, qual a principal característica que torna um bartender diferenciado?
Ser um bom anfitrião. Sorria para seus convidados, seja educado, ouça suas necessidades e faça tudo que estiver ao seu alcance para acolher bem. Eu não sei se quem tem sempre razão é o cliente ou não, mas quando você entender que  isso não é uma disputa por estar certo, e sim uma confraternização entre seres humanos, fará mais sentido.

Qual o maior erro que um bartender pode cometer na sua caminhada?
Desistir. Eu, por exemplo, gosto de competir e sempre ouvi que o único que perde é aquele que não tentou. Isso vale para todos, os que estão começando ou os que estão no mercado há anos, desistir é a única coisa que vai te fazer parar, o resto só vai te fazer crescer, mesmo as horas difíceis.

Qual a sua maior conquista na área de bartender?
Com certeza foi o World Class, não pelo título, mas pelo quanto ele transformou o que eu era. Eu sou jovem na profissão, tenho muito a aprender. Quando eu aceitei o desafio de correr um campeonato com nível de exigência tão alto, isso me fez correr para desenvolver habilidades e conhecimentos que eu ainda não tinha e ir ainda mais além para me destacar dos outros bartenders. Me trouxe várias lições de empreendedorismo e posicionamento de mercado.

Quais os seus planos para o futuro como bartender?
Eu estou voltando para casa, minha jornada em Porto Alegre está se encerrando e tenho planos incríveis para um novo projeto em São Paulo. Quero mostrar o meu trabalho pro mundo, desenvolver cocktails legais, encantar as pessoas e continuar fazendo um trabalho legal nas mídias. Apesar de alguns pensarem que bartender não é digital influencer, só eu sei o quanto esse paralelo fez e vem fazendo diferença na minha carreira.

Qual a sua visão do futuro dos bares e da coquetelaria depois dessa crise?
Eu venho observando que os bares estão começando a se levantar da crise, alguns estabelecimentos novos abrindo, os antigos se repaginando e se fortalecendo. Vejo isso como um com sinal, não sei se voltaremos a viver da forma que vivíamos antes mas hoje vejo outras portas abertas. O delivery de cocktails veio para ficar, o público está mais interessado em aprender a fazer drinks também, isso pode se tornar algo bem legal. Vamos aguardar cenas dos próximos capítulos.
 

3 CONSELHOS

Quais conselhos você daria para um jovem bartender?

1) STEP BY STEP
Um passo de cada vez, não tente pular etapas no seu desenvolvimento.

2) LAVE A LOUÇA
Valorize todas as funções de um bar, nada como um glass ware bem lavado.

3) VOCÊ NÃO É TODO MUNDO
Não perca tempo se comparando com outros bartender, foque sua energia em fazer o melhor que puder.

APRENDA A RECEITA

Três Tesouros

60 ml de Ketel One vodka
30 ml de vermute bianco com infusão de açaí
7 ml de licor de damasco

Infusão de Açaí:
100 g de açaí em pó
300 ml de vermute bianco

Misture os ingredientes e deixe descansar por 3 horas, coe em peneira fina.

Em um mixing glass com cubos de gelo mexa bem até gelar o copo. Retire o excesso de água e na sequência coloque todos os ingredientes acima, mexa novamente por 15 segundos e então com um strainer coe para uma taça martini previamente gelada, finalize com uma folha de Sálvia sobre o cocktail.

a foto de capa foi clicada por Rodrigo Marrano e todas as fotos da matéria foram clicada por Feltran Fotografia.

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