Desde os gregos antigos, passando pelas tradicões e ritos africanos e mergulhando no sincretismo brasileiro, “dar cachaça ao santo” é uma da nossas memórias etílicas mais ricas. Saiba aqui o motivo.
13 de maio é o dia de homenagem ao Preto Velho, entidade de humildade e paciência da Umbanda e também a data da assinatura da Lei Áurea, ou Abolição da Escravatura, que libertou os escravizados no Brasil, então resolvemos contar uma boa história da nossa cultura etílica.
O mito de dar a cachaça ao santo não é novidade, está tão enraizado em nossa sociedade que mal conseguimos encontrar a real fonte desse costume.Pelo interior brasileiro é possível perceber como essa tradição continua viva, ainda que as grandes metrópoles já tenham perdido muito desse e de outras rituais. Mas não só no Brasil, em países como Itália, Espanha, França e claro, Portugal é possível encontrar as mesmas características culturais.
Vamos voltar no tempo, lá na Grécia Antiga, aproximadamente dois mil anos atrás para lembrar do ritual grego Libatio, que consistia basicamente em derramar água, vinho ou óleo perfumado no chão ou no altar como oferenda aos deuses. Em outras palavras, se fazia o ritual Libatio para acalmar os deuses, e dessa forma eles proveriam os lares de fartura e felicidade.
Toda refeição era digna de uma “libatada”, correndo o risco dos deuses invejarem o banquete grego e se vingarem caso não fosse realizado o ato. Clássicos como Homero, Satyricon e até a Bíblia cita o ato da libação em mais de 30 versículos.
Desta forma, os gregos ensinaram os romanos, que ensinaram os portugueses, que nos ensinaram a jogar um gole para o santo.
Mas assim que os africanos chegaram ao Brasil e o processo de produção de cana de açúcar e de cachaça foram iniciados, os ritos africanos se acomodaram na cultura local e se tornaram muito em comum entre africanos e portugueses.
Quando os portugueses e jesuítas chegaram no Recôncavo Baiano, no século XVII, começaram impor aos escravizados que consumissem com frequência cachaça, tanto para “aumentar a produtividade”, para “esquentar” os dias mais frios como para curar os enfermos.
Junto à imposição de consumo, veio a imposição de São Benedito, filho de um escravizado, como padroeiro da aguardente. E dessa forma, a cachaça passou a ser utilizado em oferendas nas religiões africanas, principalmente no Candomblé, como um pedido de proteção aos Orixás.
É lá no Catimbó, conjunto de atividades mágico-religiosas do nordeste brasileiro, que o ato de dar cachaça ao santo se tornou absolutamente brasileiro, divididos pelas culturas dos babalorixás do Xangô, os líderes católicos expressos pelos jesuítas e os mestres do Catimbó. Antigamente era mais comum o líquido ser atirado antes de se beber. Já hoje, temos o costume de jogá-lo ao final, deixando o copo vazio.
Não há outra saída para o futuro da coquetelaria senão a compreensão da nossa cultura etílica do passado, então, na próxima dose que você pedir, entregue à entidade que você acredita, seja ela quem for um gole da sua bebida, e espere que ela lhe devolva saúde, fartura e felicidades para todos nós.
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