Saiba o que pude aprender julgando campeonatos de bartenders

Nos últimos dez anos, tive a oportunidade de julgar campeonatos por todo o Brasil e também na Argentina e pude aprender muito sobre campeonatos. Foram mais de 35 competições entre elas, Vive La Revolution de Grey Goose, Coffee in Good Spirits, Festival Mapa Verano de Campari na Argentina, Diplomático Botucal, Most Imaginative Bartender de Bombay Sapphire, Ilha Drinks e o tão disputado Bacardí Legacy.

Fato é que eu aprendi muito, mas muito mesmo com os mais de 200 bartenders que se apresentaram para mim em competições. E tenho certeza que eles também aprenderam demais vendo os outros participantes preparando seus coquetéis.

Mas será que campeonato é bom para o bartender? Para mim, sem dúvida. Traz a oportunidade do bartender se aprofundar em um tema específico, aprender sobre uma marca, compartilhar e colher experiências com os demais concorrentes e ainda por cima, figurar em um lugar de destaque por um período determinado. Sinto que vivemos o melhor momento da coquetelaria e muito se deve pela regularidade dos campeonatos de marcas ou associações.

Quero compartilhar com vocês que estão próximos a se inscrever para o grande Bacardí Legacy e disputar a chance de deixar o seu legado na coquetelaria algumas das impressões que tive sobre todo esse período.
Espero poder ajudá-los a alcançar melhores posições.

Sem ler o regulamento, não se vai a lugar algum

Acredito que se existe algo que separa os meninos dos adultos em campeonatos é o tal do Regulamento. A regra é clara. Leia o Regulamento. De novo. Leia o Regulamento. Caso você não tenha entendido, vamos lá. Leia o Regulamento. É tão simples. E tantos bartenders pecam nesse ponto tão básico.

É lá que você descobre qual a data limite, quais etapas, o que pode fazer, que ingredientes não pode usar entre tantas outras coisas. E é no Regulamento também que metade dos competidores ficam para trás.

Então, só pra não ter dúvida. Leia o Regulamento.

Grandes competidores ficam no meio do caminho

Campeonato é diferente do dia-a-dia na barra. Nem sempre o bartender mais constante, equilibrado e que consegue dosar bem atendimento, volume e agilidade é quem se sai melhor nas competições. São diferentes características que determinam isso, mas fato é, não é muito difícil ver um “novato” ou “azarão” ganhando um prêmio.

Excesso de confiança, de trabalho no bar ou pouco treino para a competição costumam ser os principais vilões dos bartenders experientes.

Em outras palavras, não deixe de participar só porque “tem muita gente boa” participando. Isso só prova que você está escolhendo o mesmo caminho que os bem sucedidos na competição, além de que, a pressão maior é sobre eles. Foi assim que o Ernesto Nica desbancou grandes nomes e conquistou o Bacardí Legacy Brasil ano passado.

Os detalhes moram nos treinamentos 

Se você leu o Regulamento, você percebeu que tipo de competição te aguarda. E aí, e hora de se organizar, criar uma linha de pensamento, uma história pra contar, uma receita e uma linha de treinamento. Isso é o que a maioria dos bons competidores fazem. Mas você pode ir além.

É a hora de desenhar todos os detalhes da sua apresentação. Investigar cada segundo seu em palco e trazer a melhor performance para os jurados. Isso é alta competitividade.

Por exemplo, se você poderá usar uma música própria na apresentação, escolha algo que cadencie a história que irá contar. Mas, algo que os jurados nunca saberão é que se você treinar sempre com a música, irá marcar o ritmo da apresentação e saberá que ao chegar no terceiro minuto, deve estar finalizar tal etapa. Isso garante que você em hipótese alguma perderá pontos ou ser desqualificado por ter ultrapassado o tempo permitido.
(*Spoiler: o regulamento do Bacardí Legacy não permite usar música na apresentação).

De qualquer forma, não se esqueça, os detalhes moram nos treinamentos.

Os competidores mais calmos são os mais preparados

Na hora H, não tem jeito, o medo chega, a pressão bate forte e é preciso ter muito sangue de barata para não ser tomado por aquela ansiedade. É normal.

Manter a calma é importante, mas entrar no clima também! Ninguém quer ver um robô se apresentando na grande final. Saber dosar o controle com a ansiedade é uma arte para poucos, mas não tenho dúvida, os que mais se prepararam, treinaram e investiram seu tempo no projeto do campeonato são os que tem melhor performance.

Uma cena que vejo com frequência, são bartenders perdendo tempo (e paciência) porque cometem falhas que não sabiam que poderiam acontecer. Uma vez, ao levantar o braço para pegar uma garrafa, o bartender esbarrou na bailarina de 30 cm e deixou o mixing glass quebrar na praça. Pow! Estava fora da briga. Isso porque ele não treinou com antecedência o layout do mise-en-place para perceber que a bailarina não poderia ficar à frente da estação, e sim na lateral e no fundo.

Conheça os jurados

Muitas vezes, os organizadores informam com antecedência quem serão os jurados da competição eu particularmente, acho uma prova de respeito ao competidor.

Quando essa oportunidade aparecer, não deixe de pesquisar quem são, o que fizeram nos últimos anos, qual o estilo de cada um e tente achar alguma conexão direta entre eles e a sua história. Claro, tudo isso sem forçar a barra, seja sutil, mas seja presente.
Isso mostra que você está atendendo pessoas, e não postes e pode te render bons pontos de hospitalidade.

Uma receita boa precisa de uma história boa

Atualmente, campeonatos são feitos de um conjunto de habilidades, não apenas uma receita incrível. Então se prepare para desenvolver um conceito que encante tanto quanto a sua receita.

Hoje existem diversos caminhos para criar um storytelling de qualidade. Pesquise sobre o seu assunto, quais são os desmembramentos dele na história, os personagens que se conectam a ele enfim, seja curioso, investigue e entenda profundamente o seu tema. Somente dominando o seu assunto você poderá gerar uma história verdadeira e nesse quesito, Matheus Cunha, bartender paulistano e vencedor do Grey Goose Vive La Revolution é um especialista. 

Uma história boa precisa de uma receita boa

Agora que você tem uma boa história, é a hora de pensar em uma boa receita. Pelo menos, do que eu pude aprender com os bartenders em competição, uma boa história sem uma boa receita é muito pior do que uma boa receita sem uma boa história.

Acontece que em grandes campeonatos, só ganha quem tem as duas pontas amarradas.

Cada campeonato tem o seu foco, por exemplo, o Most Imaginative Bartender de Bombay Sapphire pede que você vá muito além e crie algo quase impossível de se reproduzir em um bar de grande volume. Já o Bacardí Legacy preza por ingredientes de fácil acesso e fácil preparo. Ou seja, entenda o regulamento e entregue o que se espera.

Picaretas, estamos de olho

Picaretas, muito cuidado, pois a gente sente de longe o cheiro da picaretagem.
Isso porque eu, e muitos dos jurados que me acompanham, temos anos e anos de estrada e provavelmente já vimos a sua tentativa de malandragem acontecer antes de você tomar o seu primeiro Dry Martini da vida.

Então, não perca seu tempo tentando ganhar vantagem sobre ninguém, carregue o espírito esportivo, o espírito coletivo e divirta-se com seus companheiros.
Competições são acima de tudo um local para todos aprenderem se divertindo.

E como diria Ernest Hemingway, nosso guru etílico:
– Quem estará nas trincheiras ao teu lado?
– E isso importa?
– Mais do que a própria guerra.

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