Saiba o que os bartenders querem que aconteça e também o que eles querem que desapareça no ano que está só começando

Ano novo está aí e sempre dá aquela sede de descobrir quais são as tendências que vão dominar os balcões. O Mixology News sabe que isso vai acontecer naturalmente, mas quis ir além e resolveu ouvir dos bartenders o que eles desejam para esta jornada que está só começando e o que gostariam que ficasse para trás.

Para o futuro, eles querem uma barra mais suave, com menos ego, melhores condições de trabalho e mais mulheres na profissão, por favor! Já roubar receita do amiguinho, especiarias boiando na taça ballon, influenciador tirando gelo do copo para achar que tem mais bebida e coisas do tipo já nem deveriam ter visto a queima de fogos…

Alex Mesquita
Atualmente à frente do Elena Horto, Alex Mesquita é referência de coquetelaria, não só aqui, como no exterior. Um dos mais experientes e elegantes mixologistas da sua geração, está sempre atento ao que surge de novo, somando técnica e precisão a novos conceitos. Com trajetória irrepreensível, foi o responsável por colocar a coquetelaria carioca no mapa do país. Ter Alex no balcão é sinônimo de hospitalidade de altíssimo nível. foto: Tomás Rangel

Alex, o que você quer que aconteça em 2024?

– Mais mulheres comandando os balcões no Rio, especificamente, e no Brasil de maneira geral.

– Que os empresários do setor invistam mais no bar e nos funcionários, com salários mais dignos e maior valorização do bartender.

– Mais eventos de coquetelaria no Brasil, como classe maestra e tales, por exemplo.

E o que você quer que desapareça esse ano?

– Que definitivamente a indústria de bebidas pare de pagar cachê de serviços prestados dos bartenders com produtos.

– Bares e estabelecimentos que não se preocupam com os seus clientes, que só querem atender a indústria de bebidas e os embaixadores de marcas.

– Mixologistas trabalhando apenas em busca de premiações.

Igor Renovato
Igor Renovato é uma revolução atrás do balcão. Com carisma e criatividade de sobra, é destaque na coquetelaria carioca há mais de uma década e conquistou de vez os holofotes no país ao vencer a primeira edição do Campari Bartender Competition, em 2021. Líder nato, comandou a equipe do extinto Garoa com maestria durante toda a sua existência, conquistando todos os prêmios para a casa. Agora, ele parte para outra etapa da carreira, abrindo seu bar, o promissor Suru, na Lapa. foto:  Nubra Fasari

Igor, o que você quer que aconteça em 2024?

–  Maior popularização da coquetelaria.

– Valorização da cachaça.

– Senso de coletividade para o crescimento da categoria.

E o que você quer que desapareça esse ano?

– Pseudoprofissionais vendendo curso virtual de baixa qualidade.

– Influencer tirando gelo do coquetel e achando que tem pouca bebida.

– Cliente ignóbil no balcão do Suru.

Jaci Andrade
Jaci Andrade ficou conhecida do grande público ao vencer o reality show Shaking the Bar, do Sony Channel, no ano passado. Mas sua estrada na coquetelaria começou bem antes, e de uma forma bem inusitada: não foi no balcão, mas sim na área administrativa.

Desde então, participou de eventos, acumulou prêmios e trabalhou em bares importantes de sua cidade. Ou seja, não há nada num bar que a curitibana não saiba, e isso diz muito sobre ela. Muito além de um coquetel perfeito, Jaci busca essência por onde quer que passe. Não à toa, dedica parte do seu tempo ao Coletivo Corre Guria, uma rede de apoio para o desenvolvimento feminino voltado para mulheres de bar. foto: Rafael Issao

Jaci, o que você quer que aconteça em 2024?

⁃ Mais espaço para presença feminina em cargos de liderança, tanto no bar como na indústria de bebidas, e que o bar seja um lugar seguro para as mulheres de ambos os lados do balcão.

⁃ Mais sabores brasileiros dentro do copo. Pesquisa e utilização de produtos e insumos regionais e de pequenos produtores, criando redes de economia colaborativa e sustentabilidade reais.

⁃ Que possamos conviver num mercado de bons profissionais mas, acima de tudo, boas pessoas. Afinal, nosso trabalho é sobre pessoas.

E o que você quer que desapareça esse ano?

⁃ Os campeonatos com prêmios irrelevantes. Em vez disso, deveria haver mais investimento da grande indústria na formação e capacitação de bartenders.

⁃ Desejo o fim da marginalização do serviço. De nada serve trabalhar em bares belíssimos, servindo coquetéis caríssimos sob péssimas condições e salários ridículos. Isso ainda é peso da vergonhosa herança escravagista brasileira e já passou do tempo de mudar.

⁃ A escala 6×1 no bar. Isso é loucura! Tem como fazer escalas sem sugar até o último sopro de vida do ser humano.

Luiz Felipe Mascella
Luiz Felippe Mascella foi um dos grandes nomes da coquetelaria em 2023 e, pelo que tudo indica, este ano não será diferente do que passou. Seu trabalho à frente do Regô e do Terê, alguns dos bares mais aplaudidos de São Paulo, o levaram a ser destaque na lista da “Forbes Under 30”, que aponta quem são os jovens que fazem a diferença em áreas distintas.

Com uma mente inquieta, criativa e assertiva, Luiz promete uma surpresa já para o primeiro semestre deste ano e, no segundo semestre, uma novidade mais na linha de restaurante, perto do Regô. Por enquanto, tem carta nova chegando no fim do mês. Aos 29 anos, ele está só começando. foto: Guanaco Produções

Luiz, o que você quer que aconteça em 2024?

– Maior consumo de coquetéis spirit foward, ou seja, álcool pelo álcool, saindo um pouco dos sours.

– Coquetéis mais simples, sem muitos ingredientes.

– Valorização do público e do mercado, desde o barback até o bartender.

E o que você quer que desapareça esse ano?

– Clientes que não pagam o serviço.

– Roubo de coquetéis e receitas do amiguinho.

– Ego inflado por parte dos bartenders famosinhos, os startenders.

Sylas Rocha
Beber um coquetel das mãos de Sylas Rocha não é uma experiência, é um acontecimento. Mixologista, flairbartender e mágico, ele é capaz de transformar o dia de qualquer um com um sorriso no rosto e um drinque perfeito. Uma das figuras mais emblemáticas da coquetelaria paulistana, não só pelo seu estilo e carisma, mas também pelo seu talento inquestionável de farejar tendências.

Apesar de títulos mundiais e passagens por bares de Milão, Moscou, Estocolmo, Dublin, Paris e outros cantos do mundo, seu lugar é aqui mesmo, alegrando e servindo com maestria quem está do outro lado do balcão, como num toque de mágica. foto: Leo Feltran

Sylas, o que você quer que aconteça em 2024?

– Gostaria de ver coquetéis com mais sabor, mais gente nova. Para evoluir, a gente precisa de mais pessoas fazendo um bom serviço de bar, interessadas em ser diferente, em entregar mais.

– Competições mais abertas, mais justas como um todo. Nos últimos campeonatos do ano, tanto o Jose Cuervo Paloma Competition  quanto o 1883 Drink Design Contest foram bem transparentes, o que faz com que a galera volte a querer competir. Acho isso muito importante.

– A volta de programas com cursos de fotografia, design e outras competências que, somadas à profissão, fazem de você um bartender mais completo. Hoje em dia não vejo mais ninguém apoiando isso. Acho extremamente necessário para uma evolução positiva .

E o que você quer que desapareça esse ano?

– A falta de noção de sabor dos coquetéis. Hoje em dia tem coquetel com um monte de ingrediente, de conceito, de história, mas que é ruim. O sabor foi deixado de lado, e isso me incomoda.

– O ego. Vejo muito bartender não querendo ser melhor, mas querendo ser melhor que o outro. Assim a gente não cresce, não evolui, não vai para frente. Sei que o ser humano é complicado, mas isso poderia melhorar.

– A falta de atenção com os novatos. Seria legal que a grande indústria começasse a promover mais coisas para a classe iniciante de bartenders. A galera foca muito na bolha, mas o novo bartender, muitas vezes, não tem acesso a nada. E isso torna a evolução uma coisa muito complicada, não acontece. Eles deveriam ter mais acesso a informação, cursos, provas de bebidas. Não focar apenas naquele grupinho de 20 pessoas que já não se interessa mais, mas promover encontros para a nova geração. Acho que isso seria bem positivo.

Tony Harion
Ele transcende as virtudes da mixologia. Com dom de alquimista, Tony Harion criou seu próprio laboratório de bebidas, com mixers, sodas e espumas artesanais primorosas na Mixing Originals, com sede em Belo Horizonte, foi nome forte da indústria por anos, e é inspiração para muitos bartenders até hoje. Empreendedor, criador de coquetéis marcantes e educador, tem apurada percepção sensorial e desenvolveu a hospitalidade na coquetelaria como poucos no país.

Tony, o que você quer que aconteça em 2024?

– Meus votos são que os profissionais da nossa comunidade entendam a importância do aprimoramento da maturidade profissional antes de buscarem acelerar sua capacidade criativa.

– Que entendam que criatividade é importante sim, mas mais importante é saber discernir onde empregá-la e como aplicar da melhor forma essa criatividade.

– Tem horas que a criatividade é essencial, mas em outras é mais proveitoso entender qual bom clássico resolve (até melhor) uma demanda.

E o que você quer que desapareça esse ano?

– Espero que suma a ânsia de se abrir um bar com a finalidade ou propósito principal de se ganhar prêmios ou entrar para a lista XYZ. Deve-se  abrir um bar para servir pessoas, criar momento e experiências marcantes e gerar retorno ao seu negócio. Qualquer coisa fora disso está fora de propósito. O reconhecimento e os prêmios devem ser consequência do sucesso e de uma entrega bem feita, não o objetivo primário de se abrir um bar.

Vitória Kurihara
De confeiteira a bartender. A mudança de carreira, cinco anos atrás, abriu as portas de um novo universo para Vitória Kurihara, que ano passado venceu a etapa nacional do World Class e disputou a etapa internacional. Trocar as batedeiras pelas coqueteleiras parece ter sido a decisão mais acertada, já que, em pouco tempo, seu trabalho já é reconhecido no país e fora dele, e a curitibana já assina cartas não só no Paraná, mas também no Rio de Janeiro.

Vitória, o que você quer que aconteça em 2024?

– Que a gente tenha mulheres bem posicionadas na coquetelaria, e que o mercado esteja aberto para essas mulheres, que elas consigam crescer na profissão. Quando ganhei o World Class, escutei muita gentes dizendo que não tinha coragem de participar por ser mulher, e eu as encorajei. Que seja uma comunidade mais acolhedora para nós, que a gente consiga ter mais profissionalismo para lidar com essas coisas. Não é uma questão de feminismo, de empoderamento, mas de conseguir se posicionar melhor num mercado que por muito tempo foi muito masculino. Talvez isso seja polêmico, mas é algo que está dentro do meu coração para 2024.

– O Brasil tem uma cultura ruim de tequila e de coquetéis com a bebida. Agora, com a Europa se movimentado, acredito que a gente possa ter uma nova história com esse spirit.  É algo que  venho tentando usar em bar, para fazer com que meus clientes entendam e não tenham tanto esse preconceito.

– Ando trabalhando e estudando muito sobre vinhos, é um mundo muito abrangente, onde você pode botar muita história dentro de um copo e trabalhar muito bem isso nos coquetéis. É um desejo que não é só meu, acredito que outros bartenders também querem que se torne uma realidade. Até por uma questão financeira, temos marcas brasileiras fazendo vinhos muito bons, que podemos usar para fazer isso acontecer atrás do balcão.

E o que você quer que desapareça esse ano?

– Com toda certeza, o Milk Punch! Acho que deu o que tinha que dar. Eu, particularmente, não gosto!

– Uma coisa que quero que desapareça é a mistura de bebida alcoólica com energético. É horroroso, é irresponsável. Existem tantas opções. Tivemos uma onda de highball,  que não têm nada disso, e você pode beber em segurança.

– O uso ode especiarias dentro da taça baloon para fazer gim tônica! Um anis, uma pimenta-rosa e fica aquela coisa ali boiando horrorosa. É sempre bom lembrar ao seu cliente que o gim já é uma bebida cheia de especiarias, já é uma infusão. Não precisa ficar mastigando aquela pimenta-rosa que não vai dar gosto de nada. Se você acha bonito, beleza, faz na sua casa, mas, para mim, é uma coisa que tem que desaparecer para ontem.

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