A Mata Atlântica foi berço dos nossos principais povos indígenas e com eles sua cultura de Cauim e outras bebidas típicas.
No dia 14 de setembro é celebrado a ‘’Paz de Yperoig” , data do primeiro tratado de paz das Américas, que foi articulado entre o padre Manoel da Nobrega e padre Anchieta, em que firmavam a paz entre os português e os nativos Tamoios, palavra que em tupi quer dizer “o mais antigo, o ancestral, o avô.”
A Confederação dos Tamoios era formados por diferentes lideranças da região que hoje é conhecida como vale do Paraíba, litoral norte paulista e litoral sul fluminense.
Como diz a história, os próprios portugueses não cumpriram com seu acordo e logo após esse breve momento de paz ocorrido em 1563 os nativos foram novamente atacados e já enfraquecidos pelas doenças trazidas pelos europeus foram facilmente dizimados e a uma lenda diz que o morubixaba Cunhambebe, líder guerreiro e espiritual dos tamoios lançou uma maldição a essas terras, em que nada seria próspero até que o povo venerassem os verdadeiros donos da terra, coisa que não aconteceu até hoje.Esse massacre que ocorreu aqui e em muitos outros lugares do nosso litoral, e infelizmente vem acontecendo até hoje com o desrespeito a história e conhecimento dos verdadeiros nativos dessas terras, muito dos seus hábitos foram quase apagados e toda pesquisa se torna muito difícil, restando algumas poucas obras dessa primeira metade do século 16.
Assim como foi citado no “Os povos originários da Caatinga e suas bebidas ancestrais”, e também nos livros de Hans Staden, Carta de Caminha e outros registros de navegadores que estiveram por aqui nessa época é que conseguimos saber um pouco sobre as bebidas consumidas por esses povos , seus hábitos alimentares e seu vasto conhecimento das medicinas da floresta .Outro personagem que nos ajuda a entender um pouco dos costumes dos povos que habitavam essa região é Andre Thévet, que com seus textos e ilustrações descreveu os rituais de cauinagem dos Tamoios em alguns ele inclusive mostra o preparo das bebidas que eram feito exclusivamente pelas mulheres. Assim como Staden, Thévet teve contato com Cunhambebe e o representa em uma de suas ilustrações. (imagem acima)
Porém esse e outros relatos e a visão que temos dessa época é exclusivamente europeia já que infelizmente os tupinambás residentes na Mata Atlântica do sudeste foram totalmente dizimados restando apenas alguns grupos da mesma etnia apenas em outras regiões do pais.
Sabemos que eles dominavam a fermentação e tinham como o fermentado mais consumido o Cauim, feito a partir da mandioca e que era servido em diversos rituais inclusive o antropofágico que foi presenciado por Staden, Thevet entre outros e também pode ser encontrado com mais detalhes no livro “ A religião dos Tupibambas”.
No livro “A verdadeira história da cachaça”, de Messias Cavalcante, o autor fala sobre o domínio desses povos sobre a fermentação, e que apesar de nós termos maior conhecimento do cauim produzido com o milho e mandioca, eles adoravam outros tipos de fermentados feitos com inúmeras frutas como a jabuticaba, o caju e até mesmo o mel, como nessa peça do gravador holandês Jodocus Hondius chamada “America”.No livro“História natural e médica da Índia Ocidental” Guilherme Piso afirma que o Cauim poderia ser “também de outros frutos , principalmente Pacóba, Ananás, Mangába, Ianipába, Caraguatá espremidos, fabricam vinho ou bebida espirituosa semelhante, não menos capazes de embreagar”.
Uma coisa que pode se afirmar é que os europeus que se aventuraram por essas bandas não teriam sobrevivido sem a ajudo dos povos nativos, os primeiros envolvimentos na maioria dos casos foi amistoso e os europeus foram bem recebidos, cuidados e apresentados aos frutos da região que até então não tinham nenhum conhecimento.
Alguns historiadores acreditam que antes mesmo da chegada de Cabral por aqui já haviam alguns degradados por essas terras que foram deixados para aprender a língua nativa e preparar o terreno para a Invasão Portuguesa, como é o caso de João Ramalho e talvez também do Barão de Cananéia (personagem que se tem poucos registros) e de Caramuru, esse último acreditam que tenha sido um náufrago.
Mas nenhum deles teriam sobrevivido sem o conhecimento dos nativos, que lhes ensinaram como pescar, andar na mata, escolher os frutos e plantas para se alimentar entre inúmeras outras atividades que tornavam a vida desses povos possível nesse território .
Se hoje vivemos e temos nossos hábitos tudo isso só foi possível pelo conhecimento dos povos originais, a forma do caiçara viver em harmonia com a natureza e todo conhecimento que permeia essa cultura e as diferentes povos tradicionais que a habitam esse território só foi possível pelo conhecimento transmitido pelos povos originais que nunca tiveram sua importância destacada na nossa história.
Enquanto seguirmos esse caminho e não dermos valor aos verdadeiros donos da terra e respeitá-la assim como eles respeitaram e seguem a respeitar, a Maldição de Cunhambebe estará presente e nunca seremos dignos de viver nessa terra em harmonia, enquanto celebrarmos datas como “Paz de Yperoig” e silenciarmos os verdadeiros donos da terra viveremos cada vez mais distantes da terra e veremos nossos biomas morrerem lentamente até termos o mesmo fim dos verdadeiros donos da terra.
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