A cerveja, sua história e sua evolução ao longo dos anos.

A cerveja deve ter chegado nos seus dez mil anos e ontem eu acabei de fazer trinta. Isso mostra que eu não sou tão velha quanto acho, e a cerveja está cada vez em sua melhor forma.

Nessas pequenas três décadas da minha história a cerveja ganhou muito mais do que uma beersomelier apaixonada, ganhou corpo para chegar onde o vinho já está há muito tempo, no copo de quem realmente sabe apreciar uma bebida! Para eu não deixar os mais leigos vagando no espaço, aqui vai um pequeno resumo da cerveja que deve ser contado antes.

A comercialização da cerveja é algo tão recente que durante cerca de nove mil anos ela não era produzida para fins comerciais. Em 1040, o mosteiro Weihenstephan conseguiu licença oficial para vender cervejas na Alemanha.

No século XVI foram produzidas as primeiras Lagers. Em 1765 Arthur Guiness abriu sua primeira cervejaria na Irlanda, e até hoje é a cerveja escura mais vendida no mundo. No quesito Breja, a Europa é muito mais experiente do que nós, novatos no assunto, pois somente em 1808, com a vinda da família real para o Brasil, a cerveja colocou oficialmente os maltes em terras tupiniquins (apesar de sabermos que os índios daqui produziam uma cerveja feita à base de mandioca, conhecida como Cauim).

No Japão, a primeira cervejaria só foi fundada em 1870 e curiosamente hoje, o líquido amarelo ouro é mais consumido que o tradicional saquê. Eu nasci em São Paulo em 1982, e nesta mesma época em Minas Gerais nascia a Kaiser, e junto nascia a ideia do Sambódromo (local que daria lugar à guerra das cervejas main stream nos desfiles de Carnaval).

A famosa Bock foi lançada no Brasil em 1993. Em 1995, tivemos grandes mudanças, pois foi nesta época que cervejarias como Baden Baden, Dado Bier e Colorado surgiram para dar luz ao mercado de cervejas especiais – o paladar dos brasileiros estava a salvo.

Nosso país é o quarto maior produtor de cerveja do mundo. Hoje, empresas gigantescas como AMBEV e FEMSA, donas das marcas mais populares e não artesanais, tomam conta das geladeiras por aqui. Não da minha geladeira com 30 anos!CervejaNa China, a maior parte das cervejarias foi construída a partir de 1980, por conta da sua história com o governo comunista. A cerveja Snow, marca chinesa, tem números astronômicos. Esta cerveja é a bebida alcoólica mais consumida: a população gigantesca torna esta marca a mais vendida no mundo. Por lá, é vendida em sacolas plásticas – o que é no mínimo muito estranho!

Na Escócia, há pouco mais de 30 anos atrás, havia uma lei que restringia o horário de funcionamento dos pubs. Em 1979 essas leis foram abrandadas pelo License Act, que acabou estendendo os horários de funcionamento de pubs.

Na mesma época, os bares, exclusivos para homens, começaram a aceitar mulheres. Na Inglaterra, desde 1977 já acontecia o Great British Beer Festival. Tendo o grande Michael Jackson como um dos participantes deste que foi o propulsor de tantos outros festivais pelo mundo, mostrando a todos como era realmente possível unir o setor e mostrar as novidades para o ingleses.

Nos EUA, há 30 anos, formava-se uma grande aliança cervejeira entre as micro cervejarias e os cervejeiros caseiros. Em 1979, Jimmy Carter tornou legal a fabricação de até 200 litros de cerveja em casa por ano, o que era ilegal antes disso. Na mesma época, Charlie Papazian, voltando de uma de suas viagens à Inglaterra, fundou o Brewers Association, uma associação de cervejeiros, e, em seguida, o Great American Beer Festival, que no ano passado fez 30 anos.

Este festival é considerado a primeira celebração do movimento cervejeiro nos EUA, um marco que trouxe uma nova fase na indústria cervejeira do país. Com uma mentalidade de união e compartilhamento, as cervejarias tiveram como crescer. Em 1980, a Sierra Nevada Brewing Co. nascia junto com várias outras cervejarias ao longo dos próximos anos.

O volume de importação de cervejas triplicou entre 1992 e 2007. Quem sabe eu consiga ir lá para ver realmente isso acontecendo! Eu estava oficialmente autorizada a beber a partir de setembro do ano 2000. Ainda demorou alguns anos até eu me preocupar com sabor, marca, qualidade, produto – a publicidade oferecida pelas grandes fazia de mim, jovem iniciante no mundo gastronômico, alvo fácil.

Atualmente, para ser convencida, é preciso muito mais que palavras de fácil entendimento – uma boa cerveja só me convence pelos sentidos e pela informação de todo o seu trabalho. Mesmo ao longo desses anos, o nosso governo ainda não conseguiu entender as diferenças entre aqueles que produzem cerveja em larga escala e aqueles com os sinceros objetivos de quem procura evoluir com cultura, trabalho e matéria-prima de primeira, seguindo a onda da Gastronomia, com um importante aumento na qualidade dos serviços oferecidos.

Ainda sim, houve um crescimento grande na fabricação de cervejas nacionais: Minas Gerais é um dos estados mais fortes que temos hoje; São Paulo caminha já com tradição; e os gaúchos na maioria são rígidos seguidores das receitas alemãs. De dois anos para cá, os Festivais despontam em vários lugares do país e lojas com cervejas de rótulos diferentes do usual crescem a cada dia.

Nestes 30 anos percebemos, então, que, se em alguns países a cerveja mantem a tradição mais antiga de produção e apreciação, em outros, ela começou a tornar-se mais popular, mais divulgada e, também, produzida em diversas escalas.

Estácio Rodrigues, sócio-diretor do Instituto da Cerveja, escreveu, a meu pedido, um pouco sobre a sua visão do caminho em que estamos trilhando atualmente:
“O brasileiro sempre foi adepto à quantidade em detrimento da qualidade. Nas últimas duas décadas, o consumo per capta subiu de 25 para 48 litros em 2012, segundo o IBGE. Nos últimos anos, temos assistido literalmente de camarote, na Sapucaí ou em Salvador, a “Guerra das Cervejas”, onde “Zecas Pagodinhos” sambavam de um lado para outro, deixando o consumidor cada vez mais atordoado. Vimos também o surgimento do maior conglomerado cervejeiro do mundo, a AB-Imbev, nascer em questão de pouquíssimos anos, bem debaixo de nossos olhos.  
Porém, o que mais me surpreendeu foi o crescente número de bons e corajosos empresários, que decidiram remar contra a maré e investir na construção de micro cervejarias. E até mesmo ousados importadores de cervejas especiais, que resolveram atravessar o oceano em busca de produtos diferenciados. O interessante deste movimento é que ele vem crescendo a cada ano e, junto com ele, nasce um novo consumidor. Aquele que prefere a qualidade em detrimento à quantidade. Obviamente as altas taxas de impostos atrapalham o aumento do volume de venda destas cervejas ditas especiais, mas, nem por isso, essa onda diminuiu muito pelo contrário.
Vejo com muito bons olhos o crescimento desta fatia de mercado que se preocupa com origem do malte, qualidade e quantidade de lúpulo. Esse consumidor fatalmente não voltará atrás e nem se deixará picar outra vez pelos “Pagodinhos” da vida.”

Rever a história dessas últimas três décadas nos faz perceber o quanto é possível aliar crescimento, qualidade e criação de estilos distintos. A idade tem nos feito bem.CervejaE para comemorar, vou sugerir a cerveja que eu mesma apreciarei no meu aniversário, a Ola Dubh Special Reserve 30, “cerveja maturada em barris de carvalho escoceses, antes usados para maturar o Highland Park’s 30 year old Single Malt Scotch Whisky. A Ola Dubh – ou “Óleo Negro” – é a fantástica Old Engine Oil maturada em barris de whisky puro malte. É desenvolvida em colaboração entre a Harviestoun Brewery, a microcervejaria mais inovadora da Escócia, e Highland Park, um dos mais respeitados puro malte do mundo.”, trecho do site Brejas.com. Depois eu conto como foi! Um brinde à maturidade do paladar, aos anos que passam e nos dão mais conhecimento e ao amadurecimento dos consumidores e fabricantes, dispostos a fazer parte de uma grande evolução cervejeira! Que, a cada ano que passa, possamos ter mais consciência da forma como levamos nossa vida, nossas escolhas e as cervejas que retiramos das geladeiras.

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