O que devemos comemorar no Dia Internacional da Mulher? E o que ainda falta para termos uma relação de igualdade de gênero nos bares do Brasil?
Dia 08 de março é comemorado o Dia Internacional da Mulher.
Porém, é fato que essa data tem se transformado cada vez mais em um momento de reflexão sobre as relações entre o masculino e o feminino, o homem e a mulher, seja na esfera afetiva quanto na profissional.
Nós do Mixology News resolvemos aproveitar esse dia não para sugerir drinques com licor de rosas ou sangria com frutinhas vermelhas e flores comestível, mas para ouvir o que diversas bartenders tem a dizer sobre o atual momento da coquetelaria. Nossa pergunta foi:
Será que temos o que comemorar? Se sim, o que? Se não, como podemos desenvolver a sociedade para equiparar de maneira justa a profissão de bartender sem distinção de gênero?”
Com a palavra, as mulheres dos nossos balcões.
Neli Pereira, bartender e sócia do Espaço Zebra acredita que “para que a sociedade possa equiparar de maneira justa e sem distinção de gênero a profissão de bartender é preciso que a gente comece a fazer isso no universo da coquetelaria como um todo, seja na comunidade de bartenders ou na indústria, porque a sociedade não fará isso por nós” afirma.
A bartender e também jornalista acredita que num primeiro momento é preciso que as mulheres “se posicionem como bartenders, falando dessa diferença que infelizmente existe, e que a profissão ainda é bastante masculino e por muitas vezes machista.”
Para concluir, Neli acredita que o bartender precisa respeitar também quem está a frente do balcão, ou seja, a cliente. “Não existe essa de drinque de mulher, bebida de mulher nem paladar feminino. Existem mulheres que gostam de drinques mais fortes assim como homens que gostam de drinques mais fracos. Se conseguirmos eliminar no curto prazo essa distinção de gênero será incrível.”
A opinião da bartender do Guarita Bar, em SP é “que ainda estamos à passos de formiguinha, mas estamos caminhando.”
“A começar pela contratação, o que se pede para essa mulher e como ela vai ser inserida no ambiente de trabalho. O desafio dessa mulher é ser vista apenas pelo seu lado profissional e nada mais. Há quem diga que isso é uma coisa que tem que se conquistar. Mas quem disse que isso precisa ser conquistado?”
Alice acredita que esse comportamento está muito enraizado na nossa cultura e que ocorre tanto através dos companheiros de trabalho quanto dos clientes. “Acho que pra começar, tem que se olhar todos os profissionais, como profissionais, seja homem ou mulher. Aí tudo fica mais fácil” garante a bartender.
Apesar das críticas, ela acredita que já avançamos muito nas relações de trabalho.
“Acho que hoje já é mais comum uma mulher atrás do balcão. Cada dia vejo mais e mais meninas se encantando com a nossa área.” conclui.
A bartender Adriana Pino, atualmente focada em consultorias de bares, compartilha sua experiência de vida, que talvez possa ser muito comum em outros balcões.
Adriana percebeu logo no início da sua carreira que, ela mesmo se aproveitava de oportunidades de gênero que o preconceito lhe permitia, como pegar menos peso, entre outras coisas “de menina”. Porém, as consequências seriam sempre as mesmas, ser vista como alguém menos capaz e incompleta.
Foi então que a bartender resolveu dar uma guinada no seu comportamento, assumindo para si todas as atividades que um homem poderia fazer e assim foi construindo uma nova presença dentro dos bares. Em pouco tempo, não havia mais distinção, porque ela fazia igual e muitas vezes melhor do que qualquer outro funcionário do bar.
Em uma ocasião numa das casas que chefiou, ela estava atendendo um cliente que havia pedido para que outro bartender, não ela, prepara-se o coquetel para ele. Ao servir o drinque, o bartender informou que a criadora da carta de drinques era a própria Adriana, o que gerou um espanto no cliente, que só então passou a olhar para ela com mais respeito. Provavelmente o cliente reduziu as expectativas em relação à profissional, pelo simples fato de ela ser mulher.
Adriana deseja que a sociedade possa se permitir ir além dos pré-julgamentos, das ideias estabelecidas e experimentar pessoas, lugares e drinques diferentes, sem distinção de gênero.
Michelly Rossi, bartender do Fel, bar no centro de SP, acredita que o Dia Internacional da Mulher não é um dia de comemoração, celebração e tampouco de ganhar flores ou coquetéis especiais. Para ela “é um dia de luta, essa romantização do dia das mulheres é um enorme atraso” afirma.
A bartender acredita que quando comparado a uma década atrás, algumas coisas melhoraram, mas ainda há muito o que avançar. Michelly ainda deixa aqui alguns exemplos de coisas que jamais deveriam ser feitas:
- Acreditar que não tem capacidade física para um trabalho pesado;
- Achar normal um cliente homem desdenhar do trabalho de uma mulher;
- Tomar como normal piadas machistas, de dentro ou fora do balcão.
- Colegas de trabalho que não respeitam decisões de mulher, pelo simples fato de ser uma mulher,
- Acreditar que uma mulher não tem capacidade intelectual para um cargo de liderança, tudo que ela faz é questionado.
Para as mulheres que estão adentrando o mundo do bar, Michelly deixa algumas dicas.
- Comecem respeitando suas colegas de trabalho, as clientes que atendem, a suas companheiras.
- Acreditem em nossas próprias capacidades, não nos façam ter que provar mais que um homem simplesmente por sermos mulheres.
- Comecem não aceitando a proposta do patrão de fazer um coquetel comemorativo de dia das mulheres e dar uma rosa de presente.
- Usem o dia 8 de março para refletir sobre todas as formas de machismo.
A bartender Tábata Magarão, à frente do Raiz Forte Eventos e do 55Rio Hotel acredita que o grande desafio é a mudança conseguir vir de dentro do balcão para fora, e as próprias mulheres reeducarem nossas expressões e como nos colocamos como profissionais não nos permitindo e denunciando.
” As conquistas no meu caso foram nunca ter sido diferenciada por colegas de trabalho ou salarialmente por onde passei, mas vi alguns profissionais diferenciarem chefes homens de chefes mulheres em questão de respeito, vamos cultivar a inclusão e a empatia, para colher as futuras conquistas” afirma Tábata.
Ela ainda acredita que “nós estamos conquistando cada vez mais voz e notoriedade e a discussão está aí, cada vez mais bartenders e chefes de cozinha estão ganhando espaço nesse universo de A&B, somos muitas comparado ao passado, mas ainda somos pouquíssimas para uma realidade atual.” conclui.
Elen Souza, uma das bartenders do Vizinho Bar, no RJ, entende que a distinção entre profissionais tem que se dar pelo esforço e pelo intelecto.
De acordo com Elen,“As pessoas tem que evoluir primeiro no jeito de pensar, não existe homens ou mulheres no mercado de trabalho, existe pessoas capacitadas e esforçadas ou não”.
“Quando as pessoas começarem a pensar no que o profissional tem pra entregar, e pararem de se preocupar se a pessoa tem força para o trabalho por que ela “parece frágil”, o cenário vai começar a mudar.” conclui a bartender paranaense.
Para a bartender do HØC – House of Cocktails de Copacabana, Laura Paravato, “os homens precisam realmente enxergar as mulheres como profissionais e não sexualizarem a relação de trabalho. É preciso abrir espaço para elas mostrarem seu trabalho, de maneira honesta e profissional” afirma a carioca.
“Falta um reconhecimento honesto do mercado para uma profissional competente apenas pelos seus atributos profissionais e não estéticos.” conclui.
Laura é otimista em relação ao futuro. Apesar de acreditar que estamos no início da caminhada, vê com muita confiança os passos que foram dados desde já.
A bartender do Espaço 13, na Bela Vista, em SP acredita que a coquetelaria está em constante evolução e que infelizmente, para as mulheres ainda é muito difícil crescer na profissão porque os homens simplesmente não acreditam no potencial feminino. Ainda acham que é uma profissão típica de homem.
Ela cita uma passagem recente, quando a bartender conquistou um campeonato de coquetelaria e pode perceber a indignação da maior parte dos competidores masculinos.
“Mas estamos aí, fazendo a diferença. Eu sigo lutando por meus ideais sendo mulher. Sabendo que enfrentamos muito preconceito mas que temos que seguir em frente e fazer a diferença” conclui Stephanie.
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