Ressaca minha, tão velha amiga, que bom te ver outra vez.

Sente-se aqui do meu lado, peça mais um trago e vamos conversar: como anda a vida?

Ressaca antiga, antes dos 30, eu nem sabia o que era sentir. Foi na minha maturidade, como perder a virgindade, que você se revelou.

Ressaca, o jeito que você me abraça, com suas mãos pequenas, com seu corpo todo, com seu hálito gostoso e voz suave: canta alguma coisa pra mim?

Ressaca, na minha cabeça lateja uma ideia sua.

Foi você quem me deu essa alma, que me emprestou algum juízo, que me ensinou tudo o que sei sobre causas e consequências. Você, ressaca, é a minha coerência.

Tem dias que vale a pena, tem manhãs que me quer na cama, tem vezes que é o drama de qualquer trabalhador. Ressaca, musa democrática, vem pra mim, vem pra quem tem Dry Martini, vem pra quem toma de alambique, vem pra quem deixou pro santo ou ainda não.

Somos todos iguais na sua presença, súditos, humildes e humanos.

A ressaca de segunda-feira, começou na sexta.

Ressaca, feito ex-namorada, daquelas que a gente jura que “nunca mais”, que não quer ver nem pintada de ouro, que é coisa de um passado tonto e embriagado. Angostura que dura um dash de segundo, que se esvai no exato momento em que eu chamo o garçom, que faço aquele gesto universal com a mão, e sinto bater uma nostalgia de balcão – e a vontade de estar junto por mais uma rodada.

Ressaca, volta.

Não creia em tudo o que se diz, em todas as intrigas, picuinhas e essas fofoquinhas maldizentes sobre você, nada a ver. Você é maior. Você nos faz melhor. Sem você, sem a sua ideia, sem a sua onipresença e sombra, eu já estaria em coma.

Ressaca, fica mais um pouco. Já pedi duas garrafinhas de água. Vamos molhar a palavra. Ainda preciso dizer que te amo.

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