Setembro de 2025 ficará marcado na vida dos bartenders como o mês em que confiança virou o ingrediente mais valioso do bar.

Uma avalanche de notícias recentes deixou o mercado de bebidas alcoólicas, bares e restaurantes em estado de alerta: ao menos 11 casos de intoxicação e 102 investigações estão em curso no Brasil por suspeita de contaminação por metanol em bebidas adulteradas.

É importante reforçar que em todos os casos, são as pequenas adegas e bares comuns que estão no alvo. Não há nenhuma ocorrência do gênero para bares de coquetelaria, o que reforça o entendimento de que são setores específicos que colocaram a cadeia toda em perigo.

O episódio, que já ganhou destaque em veículos internacionais como The Independent e BBC, levanta uma questão urgente. Como proteger o consumidor e preservar a reputação da coquetelaria nacional diante desse risco invisível?

O que é o metanol — e por que ele é tão perigoso

O metanol é um álcool industrial, utilizado em combustíveis, solventes e produtos de limpeza. Diferente do etanol, o álcool etílico usado em bebidas, ele não é seguro para consumo humano.

Em doses mínimas, pode causar cegueira, falência renal, coma e até morte. O problema surge quando produtos ilegais ou falsificados substituem o etanol por metanol — uma prática criminosa que volta a circular em momentos de crise econômica.

O impacto direto nos bares e na confiança do público

Mesmo que todas as investigações apontem com clareza que contaminação não tenha ocorrido dentro da indústria de bebidas alcoólicas e nem de bares formais e legalizados, o dano à imagem do setor é inevitável.

A manchete “coquetel com metanol” é suficiente para gerar medo e desconfiança, especialmente entre consumidores ocasionais.

Bares especializados em coquetelaria tem sofrido uma drástica redução na presença do público e consequentemente, no faturamento do negócio. Nos grupos de empresários e gerentes de bares da capital paulistana, há relatos de uma redução entre 40 a 70% do faturamento comum para o período.

Para muitos bartenders, esse tipo de crise reforça a necessidade de transparência e rastreabilidade total dos insumos. Cada garrafa, cada lote, cada fornecedor precisa ser certificado.

Para Gabriel Santana, bartender e sócio do Santana, bar especializado em coquetelaria: “A qualidade de cada produto, desde o limão, xaropes, gelo até os destilados, passa por um controle seríssimo de qualidade. Qualquer coisa que coloque em risco não passa. Para isso, nós temos processos claros e confiáveis. Recebemos no bar amigos, família e clientes, e temos a consciência de que aqui é um lugar livre de riscos dessa natureza.”

O papel da fiscalização — e o que falta

As operações de vigilância sanitária e órgãos estaduais têm agido pontualmente, mas a fiscalização preventiva ainda é frágil. Falta equipe e órgão que possam investigar constantemente a cadeia que integra produtores, distribuidores e estabelecimentos e aumentar os canais de denúncia deste tipo de crime.

Não é de hoje que vivemos com o fantasma da bebida batizada. O crime de adulterar bebidas de alta qualidade com líquidos de menor qualidade e gerar lucro com isso já é conhecido na boca pequena dos bares e eventos de todo o país.

Agora, é inédito a adulteração de bebidas alcoólicas à base de etanol por bebidas à base de metanol. Segundo especialistas, o metanol raramente entra por “acidente”. Ele chega ao mercado por redes paralelas de bebidas falsificadas, vendidas como destilados premium a preços baixos.

E aqui mora a primeira regra de ouro:
Qualquer oferta muito barata de bebidas alcoólicas deve ser vista com desconfiança, seja por conhecidos ou desconhecidos.Mas o que os bares podem fazer para se proteger das bebidas adulteradas?

Independente do tipo de bar ou restaurante, da região do país ou do leque de produtos na prateleira, existem ações práticas e imediatas que todo bar pode adotar para fortalecer sua segurança operacional:

1 – Verificação de procedência:
Comprar apenas de distribuidores oficiais, se possível, homologados pelas empresas de bebidas e manter notas fiscais arquivadas.

2 – Controle de estoque rígido:
Identificar todas as garrafas que chegam no bar no momento do recebimento e isolar qualquer produto e garrafa com o lacre original danificado ou com odor alterado.

3 – Treinamento de equipe:
Bartenders e gerentes devem saber reconhecer sinais de adulteração.

4 – Comunicação transparente:
Compartilhar com o cliente quando necessário as notas fiscais de compra e manter o compromisso com insumos seguros e rastreáveis.

5 – Quebre suas garrafas:
O principal motivo da adulteração acontecer são as garrafas vazias que voltam a ser preenchidas. Com cuidado, quebre as garrafas, rasgue ou queime os lacres originais.

Steph Marinkovic, bartender e sócia do Fifty Fifty Bar, especializado em coquetelaria, conta que contrata mensalmente uma empresa especializada em recolha de lixo. E de todo o lixo retirado, metade são em garrafas. “Aqui quebrar as garrafas já não é uma novidade, mas queremos fazer isso de uma forma ainda mais segura para todos.”

No curto prazo, uma crise, no longo prazo, um setor mais forte

Por mais grave que seja, essa situação também abre espaço para uma discussão sobre como tornar o mercado da coquetelaria mais profissional, consciente e ética.

O Brasil tem centenas de bares séríssimos, marcas locais competentes e uma comunidade criativa que sabe reagir rápido. Transformar o medo em informação — e a crise em oportunidade — é o caminho para garantir que o público volte a levantar o copo com confiança.

O diretor de bares do Grupo Dargas, Charles Farias afirma: “Adotar práticas mais consistentes e definir protocolos mais transparente , reflete uma preocupação e um posicionamento profissional , de não apenas manipular bebidas e sim que nos preocupamos com as pessoas e com o que eles estão bebendo. Um pacto de uma comunidade engajada e responsável socialmente.”

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