Qual é a verdadeira Guerra dos Canudos na coquetelaria?

Por algum motivo pouco explicável, toda vez que vejo alguém bebendo algo com canudo, penso numa menina bem fútil. Não sei, acho que é aquela boquinha meio Bianca que dá um ar de pouca credibilidade.

E, no fundo, é verdade: com raríssimas exceções, os canudos tem uma conotação pejorativa. Soa-me como falso moralismo, coisa de quem bebe golinhos tímidos para parecer comportado.

É aquela história de ir pro motel e pedir um abraço, ou ao McDonalds e pedir uma salada. Beber com canudo também tem algo de meio-coito. Eu quero beber de boca larga e me irritar com o caco de gelo que veio junto – chupá-lo, mordê-lo, engoli-lo.

Eu quero ver a mancha do batom da moça no copo, os lábios (cor de mel ou sangue) desvirginados pela laranja do Negroni, a dormência do gelo fazendo o beiço debaixo chupar o de cima para esquentá-lo, o branco do dente à vista, a gotinha sendo resgatada do canto da boca. É lindo, é sexy.CanudosClaro, os canudos não são um desserviço, eles tem seu lugar. Lembro-me de que era clássico matar aula para ir à feira comer pastel e beber garapa naqueles saquinhos plásticos. Como proceder? Ou, por exemplo, tomar milk shake, toddynho, água de coco. Canudo cabe onde é funcional e facilita.

O problema foi a fetichização do tubinho. É canudo em tudo e de todo jeito: sanfonado, listrado, colorido, fino, grosso, PVC e até aquela indecência com uma colher na ponta (aqui devo admitir que ele faz algum sentido, porque foi feito pra bebedor de saquerinha de lichia e eles se merecem).

A revolução chegará quando o canudo se achar adulto suficiente para se meter com gente da alta cúpula. Porque, não bastando ser o babaca que reprime toda a sensualidade de beber de boca nua, ele ainda é um covarde, só mexe com os mais fracos.

Nunca vi canudos se meterem com Dry Martini, Champagne ou Mouton Rothschild – ali é o ministério da pinga. Ele vai pra cima dos mais ingênuos, das bebidas despreocupadas: gim tônica, caipirinha, milk shake, cuba libre, etc. Isso é bullying.

Dia desses me serviram um Negroni em copo alto e com canudo preto de balada. Ora, francamente. Deu vontade de falar “isto é um Negroni, mais respeito!”. Mas eu só me calei e coloquei o intruso de lado. Foi então que um cara da mesa se manifestou partidário da minha causa. Deu aula de anticanudaria, disse que já não aguentava mais e que queria organizar um movimento – e aqui eu lhe vos proponho. Alea jacta est.

Mas não se preocupem, canudeiros. Quando a revolução chegar, ninguém sairá perdendo. A luta é pela opção e aceitação, como acontece com nota paulista e segunda via do cartão. Vai economizar dinheiro, trabalho e minha indisposição. Não custa perguntar e é até sustentável. “Aceita canudo, senhor?” Não. Só se for o óculos do Chaves (esse pode).

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