Conheça os bares que são capitaneados pelos seus chefes de bar, ou também pode chamá-los de patrão

“Por favor, quero falar com o dono daqui, não com você!” Quantas vezes essa frase arrogante já não foi repetida por clientes prepotentes, que acreditam que em um bar, toda a equipe deve ser mão de obra contratada? Pois esse tempo está chegando ao fim. Nunca na história da coquetelaria brasileira, tantos bares foram abertos tendo bartenders como sócios-proprietários. É um movimento inédito, que altera a forma como as relações clientes-funcionários-empresários se sustentaram desde sempre neste país.

O resultado disso são bares com ambientes menores, projetos de longo prazo, menor imediatismo financeiro, modelos mais economicamente sustentáveis e alta qualidade como um dos pilares de investimento no negócio. É possivelmente, a mais relevante mudança nos rumos do ainda recente mercado da alta coquetelaria do país.

Para quem teve a oportunidade de conhecer os bares dos anos 80, 90 e 2000, a diferença na construção de um modelo de negócios dos bares é nítida. Lá no século passado, empresários muitas vezes despreparados para ter um negócio no ramo de A&B, faziam investimentos de suas reservas pessoais, enquanto multinacionais de bebidas investiam no escuro valores astronômicos para “comprar exposição de prateleira” e “exclusividade de venda”, as prateleiras eram dominadas por produtos de baixa e média qualidade, raras exceções produtos de alta qualidade e clientes desconfiavam da capacidade técnica e da qualidade dos coquetéis servidos pelos barman.

Esse cenário desolador dos anos 90 foi o berço de um movimento que acontece em 2017. Conversamos com algumas das figuras que estão transformando a cena da coquetelaria no país para entender os motivos dessa revolução.

Acompanhe abaixo, mas primeiro, confira a linha do tempo dos bares abertos por bartender nos últimos anos.

2009 | SP | Shaker Club – Clébio Mendes, Derivan de Souza  / fechado

2009 | ES – Birita Casa de Cocktail – Diogo Cypriano

2010 | SP | At Nine – Talita Simões / fechado

2011 | SP | NOH Bar – Sylas Rocha, Diego Dillon e Pablo Moya

2013 | SP | Casa Café – Marco De la Roche / fechado

2013 | SP | Boca de Ouro – Arnaldo Hirai e Renato Martins

2013 | SP | The Meatball House – Márcio Silva / fechado 2013 | ARG  | Floreria Atlantico – Tato Giovannoni

2013 | MG | Meet Me – Filipe Brasil

2014 | RJ | Mixxing RJ – Alex Miranda e Lelo Forti

2014 | CTBA | Tiger – Igor Bispo

2015 | RJ | Creative Bar – Fabian Martinez

2015 | SP | Frank – Spencer Amereno

2016 | RJ | Vizinho –  Jéssica Sanchez

2016 | SP | Frigo – Sylas Rocha, Diego Dillon e Pablo Moya

2016 | SP | Guarita – Jean Ponce

2016 | SP | BiriNait – Talita Simões

2016 | SP | Peppino Bar – Fabio La Pietra

2016 | SP | Guilhotina – Márcio Silva 2016 | BH | Bermudas Drinkery – Kaká Amaral

2016 | SC | RabodiGalo  – Felipe Palanowski

2016 | RJ | Atlantico Rio – Tato Giovannoni / fechado

2016 | SP | Raiz Bar  – Laércio Zulu 2017 | SP | Juniper 44º – Matheu Cunha

2017 | RJ | NOSSO – Tai Barbin

2017 | SP | Apothek – Alexandre D’Agostino

2017 | SP | Boteco Paramount – Netinho

2017 | POA | Mr.Jeff – Jefferson Reimann

Segundo Tai Barbin, que abriu este ano o NOSSO, em Ipanema, RJ , vê como maior desafio a necessidade de conquistar um público que está acostumado a passar a tarde toda na calçada bebendo cerveja e convencê-lo a tomar drinques cinco vezes mais caros com ingredientes que ele nunca ouviu falar. Tai aconselha que para abrir o próprio bar é preciso ter uma linha muito clara entre paixão e negócio. “Um não funciona sem o outro, mas é importante colocar seus gostos pessoais de lado para gerir o negócio, senão, a conta não fecha” conclui o bartender. Mas nem sempre abrir um bar é garantia de segurança econômica. Com a crise que se estende nesse país nos últimos três anos, é preciso planejamento e uma dose de coragem para empreender. Matheus Cunha, que foi bartender e sócio do The Juniper 44º no Itaim, em São Paulo, teve que  se preparar para o momento turbulento que a macroeconomia brasileira atravessa.

No momento, os sócios da casa estudaram meticulosamente não só os efeitos dos desdobramentos da crise política e econômica, mas também a alta concorrência que tem se estabelecido com a abertura de bares na cidade paulistana. Porém, Matheus afirma que um dos diferenciais para o superar os desafios dos primeiros anos no negócio era sem dúvida, focar na qualidade do que é servido. “Qualidade em primeiro lugar e em todos os sentidos. Seja no coquetel, no atendimento, ambiente, música, louça, entre outros. Existem diversas maneiras de reduzir custo sem baixar a qualidade.” Para driblar os riscos financeiros de uma empreitada que, no fim das contas, é um tiro no escuro, muitos bartenders/empresários decidiram abrir seus próprios negócios em regiões menos exploradas pelos bares e restaurantes, reduzindo assim significativamente o custo fixo em imóveis. Bons exemplos dessa estratégia são o Birita Casa de Cocktail em Vitória e a Mixxing no Rio de Janeiro.

Para Alex Miranda, bartender e sócio da Mixxing, escolher abrir as portas do bar em pleno bairro do Rio Comprido, foi uma grande aposta. “O lugar era completamente fora da rota gastronômica da cidade, além do entorno não ser muito atrativo. Isso ajudou a fortalecer o nosso clima de speakeasy, já que a incerteza do cliente era uma constante. Porém o boca a boca funcionou tão bem que acabou se tornando uma experiência única da cidade”. No mês de maio, a Mixxing se mudou, do Rio Comprido para o segundo andar de um casarão no bairro de Botafogo, mantendo seu clima intimista.Diogo Cypriano tinha acabado de voltar de um período vivendo e trabalhando em bares na França, quando a oportunidade de abrir um bar na Rua da Lama, no centro de Vitória bateu a porta. De acordo com Diogo, o desafio sempre foi convencimento. “Convencer clientes que tomar um drinque era mais interessante do que novamente uma cerveja. Dessa forma, O Birita se especializou na coquetelaria popular, ou seja, prática, rápida, saborosa e acessível.” O drinque Forrozinho, clássico do bar, chega a vender 3.000 unidades por mês.  Jessica Sanchez, do Vizinho, bar recém inaugurado no complexo Vogue Square, na Barra da Tijuca, vê como grande desafio transformar o público consumidor de “fruta macerada com álcool e açúcar” em público consumidor de coquetéis de fato. “É preciso trabalhar em cima de uma coquetelaria genuinamente própria, para que os clichês clássicos sejam menos relevantes do que a nossa proposta autoral de coquetelaria.” É esperado que esse movimento continue, naturalmente, alguns bares venham a fechar, mas que essa cultura se mantenha sustentável a longo prazo. Então, nosso conselho é, no momento certo, com suficientes habilidades adquiridas, seja você também um bartender patrão.

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